terça-feira, 26 de maio de 2009

8 meses

O tempo corre veloz. O tempo parou. Cruelmente rápido. Cruelmente lento. Há oito meses perdia quem mais amo e as nossas vidas mudariam para sempre. Uma ténue linha entre o sobreviver e o enlouquecer. Uma recta em piloto automático sem fim à vista, onde os nossos corpos se arrastam lentos e cegos, procurando todas as respostas que escasseiam, pedindo forças que nos ajudem a continuar. Tentando escapar ao limiar da loucura. E para outros tão fácil. Guardo todos os segundos daqueles primeiros dias e ao mesmo tempo o meu coração não aguenta e esconde-os num cantinho. E tudo vira um vazio. Na semana passada passei por uma rapariga. Dentro do carro olhei-a, reconheci-a e segui em frente, virando costas a um passado que não me quero lembrar. Há oito meses praticamente não a conhecia, embora soubesse termos um universo comum. Hoje não a conheço também. Lembro-me que no dia seguinte, apática e sem saber o que fazer, com uma onda de solidariedade enorme às costas e no coração, tentando proteger os meus pais e os demais, sentia-me observada. Essa pessoa estava no meio duma multidão, olhava-me como tantos mas incomodou-me. E quando se dirigiu a mim, estranha, não percebi. As palavras que me disse na altura enfureceram-me. Despropositadas. Inusitadas. Foram isso tudo. E no meio desse tudo disse-me também que o tempo me faria ver o quão verdade era o que me dizia. E desculpou-se pelo timming escolhido. Disse apenas que tinha de seguir o coração, assim mesmo sem me conhecer e dizer-mo pois tinha-lho dito a Ele também poucos dias antes. Calei o grito furioso que teimava em sair. Recusei-me a acreditar. Não tinha o direito de dizer o que disse. Não tinha. Esta semana quando a vi senti-me envergonhada e por isso mal a olhei. Não tive coragem para lhe dizer que tinha razão e que infelizmente eu estava enganada. O tempo, esse maldito que não se pode puxar atrás mostrou-mo. E serve-me hoje o consolo de saber que Ele pelo menos sabia. E serve-me o consolo e o orgulho de ter tido um irmão como Ele que faz pessoas desconhecidas lançarem alertas só para nos pouparem dores desnecessárias. Todos os dias ao deitar peço-Lhe forças para o dia seguinte. Que ajude pelo menos os meus pais. Que lhes amenize um pouco o sofrimento e os guie. Que lhes dê força para continuar e lhes limpe as lágrimas. Para que eu quando ouvir o telemóvel a tocar não trema. Como tremi naquela manhã quando o meu coração me disse que algo havia acontecido. Como tremi quando às seis da manhã me disseram que o O. levou um tiro. Como tremo em cada telefonema a pedir para ir buscar a nossa mamã ao serviço ou ao hospital. Como na semana passada em que ela mal conseguia falar. E a mim incrédula e impotente, sem conseguir amenizar a sua dor, nada mais me resta do que limpar as lágrimas, pôr um rosto calmo, ir busca-la para a deitar e dar-lhe um pouco de paz. Tento protege-los da dor dilacerante que trago no peito. Recolho-me nas amigas, naquelas que são bem mais que isso. Que acompanharam tudo e que ouvem os meus gritos de revolta, que dão um carinho à nossa mãe e que conversam com o nosso pai. E na família que é isso mesmo , família e que está sempre presente. Onde incluo o O. Um marido incansável que mostrou ser isso mesmo. Um marido em toda a ascensão da palavra. Que sabe que adoptamos esse termo e essa postura e mostrou-o. Que sabe que as coisas não se esquecem assim num piscar de olhos de oito meses e que me disse para seguir o coração na hora decidir se acreditava naquela rapariga, que estaria cá para me apoiar se saísse ainda mais magoada. E esteve. No fundo, ele perdeu um irmão também. E a memória dele vai além do que isso. Tenho tanto para Te dizer Bruno. Tanto. Que continuo sem acreditar e sem conceber a minha vida sem Ti. Que todos os dias, no cimo das nossas escadas tenho a secreta esperança de Te ver chegar. Lindo. Sorridente. Bruno.


Amo-te muito irmão

1 comentário:

Poetic Girl disse...

Sabes compreendo bem a tua dor. Também eu já perdi duas pessoas importantes na minha vida. E acredita que não sei onde vamos buscar forças para continuar vivendo. E morro, morro, de medo só de pensar que poderá acontecer novamente, também eu vivo no limiar da saudade que nos consome por dentro. Deixo-te um beijinho e força. Se precisares de desabafar, tens o meu contacto no meu blogue. beijinhos fica bem